O Bioma Pampa poderá ser salvo, conservado e inserido na economia?
Foto 1. Morros da Serra do Sudeste, em Caçapava do Sul (RS), representando paisagens de grande atrativo turístico, resguardando geobiodiversidade e comunidades tradicionais do Pampa.
Fonte: Do autor
Paulo Brack
Biólogo, Professor do Departamento de Botânica da UFRGS e membro da coordenação do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá) – Autor convidado
Foto 2. Capões e campos de baixadas na região da Depressão Central, em General Câmara (RS), representando remanescentes de vegetação natural cada vez mais raros, cercados por enormes plantios de eucalipto e acácia-negra.
Fonte: Do autor
No ano passado, o Dia do Pampa, 17 de dezembro de 2022, passou despercebido pelos governos do Estado do Rio Grande do Sul e do Brasil. Talvez ignorem que foi o bioma brasileiro que mais perdeu área de vegetação original nos últimos 37 anos (3,4 milhões de hectares), ou seja 29,5%, alcançando média anual de 157 mil hectares/ano, na última década (PROJETO Mapbiomas, 2022)². Provavelmente, também, não percebam que o RS é o único estado do Brasil que possui este bioma que ocupa 194 mil km2 (IBGE, 2019)¹, correspondendo a quase 70% do território estadual (metade sul e parte do noroeste), o que representa 2,3 % do território do país. Para completar, nas últimas décadas os governos nada fizeram para superar o minúsculo percentual de superfície de unidades de conservação, de cerca de 3%, de seu território no Rio Grande do Sul.
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A Conservação dos morros de Porto Alegre reconhecimentos necessários ao patrimônio ambiental – BIól. João Roberto Meira
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Foto 3. Espécies ornamentais de campos nativos (petúnias e margaridas) encontradas em beiras de estradas do RS, pois as monoculturas de soja e eucalipto, para exportação de grãos e celulose, ocuparam seus habitats originais.
Fonte: Do autor
A perda do bioma no Brasil, principalmente campos, na realidade, corresponde a substituição para dar lugar a monoculturas convencionais, destacando-se os milhões de hectares de soja, outras centenas de milhares de silvicultura, em gigantescos desertos verdes, adicionando mais áreas de mineração, entre outras atividades que fazem minguar seus ecossistemas naturais.
A área de silvicultura³ no Pampa foi a que mais cresceu relativamente entre 1985 e 2021, representando um aumento de 1.641%, ocupando atualmente 3,8% de seu território sem contar os milhões de hectares de monoculturas de soja e outros grãos ou mesmo de pastagens artificiais (monoculturas de forragens exóticas).
Para enfrentar o problema, uma das reivindicações dos moradores tradicionais do bioma, da academia e de ambientalistas é buscar formas de resistir à conversão de suas terras em lavouras convencionais, o que implica no cumprimento da Reserva Legal, das Áreas de Preservação Permanente, dos Planos de Recuperação Ambiental do bioma, após a Lei Federal nº 12.651/20124, a criação de unidades de conservação e manter a pecuária sustentável e atividades associadas, a fim de manter um mínimo de remanescente que impeçam o desaparecimento do bioma nas próximas décadas.
Por outro lado, estamos diante de um bioma que abriga mais de 3 mil espécies, sendo 80% pelo menos de campos e outros ecossistemas não florestais pouco valorizados, e que contribuem para o equilíbrio ecológico e para a economia. O Pampa possui fundamentalmente a vocação para a pecuária em campos nativos, com turismo rural e ecológico em suas muitas dezenas de locais de paisagem natural, histórica e cultural. Os governos poderiam e deveriam mantê-lo em uma economia virtuosa, com sociobiodiversidade, uso de plantas forrageiras, medicinais, ornamentais e frutíferas, com dezenas delas já utilizadas em outros continentes, associadas a modos de vida interdependentes de um bioma ainda muito negligenciado.
Foto 4. Monoculturas de soja em áreas originais de campos do bioma Pampa no RS, já alcançam no RS 6,5 milhões de hectares.
Fonte: Do autor
Foto 6. Um tipo de petúnia (gênero Calicrachoa) do Pampa no RS, usada já na Europa.
Foto 5. Eucaliptais em General Câmara (RS), em áreas de campos nativos que abrigavam centenas de espécies vegetais.
Fonte: Do autor
Foto 7. Plantas ornamentais do Pampa no RS.
Fonte: Do autor
Fonte: De Ana de Araújo Carrion, Ismael V. Brack; Ricardo Aranha Ramos; e Roberto Verdun
Referências
1 IBGE 2019. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/apps/biomas/pdf/Lim08_BiomSist.pdf. Acesso em
2 PROJETO MapBiomas – Mapeamento Anual de Cobertura e Uso da Terra no Pampa: destaques do mapeamento anual da cobertura e uso da terra no Brasil de 1985 a 2021: Pampa. [S.l. , s.n.], 2022. 22 p. (Coleção 7). Disponível em: https://mapbiomas-br-site.s3.amazonaws.com/MapBiomas_PAMPA_2022_11.10__1_.pdf Acesso em: 9 dez. 2022
3 PAMPA passa por profundas transformações e está cada vez mais distante de sua configuração original.
[S.l. , s.n.], 2022. Disponível em: https://mapbiomas.org/pampa-passa-por-profundas-transformacoes-e-esta-cada-vez-mais-distante-de-sua-configuracao-original. Acesso em: 9 dez. 2022
4 BRASIL . Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012.
Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as Leis nºs 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nºs 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Brasíla [DF]: Presidência da República: [s.d]. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12651.htm. Acesso em: 9 dez. 2022