top of page

Corredores Ecológicos como instrumentos de planejamento urbanístico e ambiental

Design sem nome (4).png

Fonte: Canva

João Roberto Meira

João Roberto Meira
Biólogo e Mestre em Ecologia terrestre – Secretaria Municipal do Meio Ambiente Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) – Equipe de Uso e Ocupação do Solo – Associado da Astec

Álvaro Debom Steiw

Álvaro Debom Steiw
Arquiteto – Secretaria Municipal do Meio Ambiente Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) – Coordenação do Licenciamento Ambiental – Associado da Astec

Sérgio Alencar Mielniczuk de Moura

Sérgio Alencar Mielniczuk de Moura
Engenheiro Agrônomo – Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) – Equipe de Uso e Ocupação do Solo - Associado da Astec

Gerson Luís Mainardi

Gerson Luís Mainardi
Engenheiro Florestal - Mestre em Manejo Florestal – Secretaria Municipal do Meio Ambiente Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) – Unidade de Proteção do Ambiente Natural – Associado da Astec

Janine Viezzer Nascimento

Janine Viezzer Nascimento
Engenheira Agrônoma – Secretaria Municipal do Meio Ambiente Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) – EUOS/CLA/DLMA – Associado da Astec

Paulo Lima Loge

Paulo Lima Loge
Arquiteto e Urbanista – Secretaria Municipal do Meio Ambiente Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) – CPPP-SMOI – Associado da Astec

Soraya Ribeiro

Soraya Ribeiro
Bióloga e Doutora em Diversidade e Manejo da vida silvestre – Secretaria Municipal do Meio Ambiente Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) – Chefe do Setor da Fauna Silvestre – Associada da Astec

Valéria Damasceno Ferreira

Valéria Damasceno Ferreira (colaboradora)
Arquiteta e Urbanista – Secretaria Municipal do Meio Ambiente Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) – DPU – Associada da Astec

1 - A paisagem natural, a expansão urbana e suas conexões

A qualidade de vida no amplo espectro das dimensões sociais, econômicas e ambientais depende, no espaço e no tempo, da manutenção de padrões da paisagem natural, capazes de assegurar o funcionamento dos ecossistemas naturais mantendo sua diversidade biológica e a continuidade de processos naturais que permitem a prestação de serviços ecossistêmicos tais como a polinização das plantas, a purificação das águas e a regulação climática.

Em Porto Alegre esta paisagem formada originalmente por ecossistemas diversos, tais como as florestas de Mata Atlântica, os campos do bioma Pampa e os banhados, em um relevo composto por morros, ilhas sedimentares deltaicas, restingas e planícies de inundação, compunham um mosaico interligado por corredores ecológicos naturais.

A fauna e a flora sempre fluíram por estas paisagens ecológicas através de cursos d’água, ou de diferentes hábitats em conexão, permitindo a dispersão e o intercâmbio genético entre diferentes populações de espécies e a recolonização de áreas após aos episódios de inundações, secas e/ou incêndios. Estas vias de conexões ou corredores ecológicos naturais são ao mesmo tempo responsáveis pela saúde genética dos seres vivos, e, pela resiliência eficaz às mudanças ambientais e climáticas que conferem aos ecossistemas interligados.

Esta matriz da paisagem original vem sendo substituída com a expansão urbana, a agricultura, a pecuária, e outras atividades humanas, reduzindo a diversidade biológica através da fragmentação e isolamento destes hábitats alterados, da poluição, da degradação ambiental e do trânsito intenso de veículos automotores.

Como estratégia para a conservação das áreas naturais remanescentes, grande parte destas áreas vocacionadas à conservação da biodiversidade, dada a presença de bens ambientais diversos incluindo nascentes d’água, arroios, terrenos declivosos, áreas úmidas, matas de restinga e espécies endêmicas, raras e ameaçadas de extinção da fauna e flora nativa, estão gravadas no PDDUA como Áreas de Proteção do Ambiente Natural (APANs) – Mapa 1 

Mapa 1 – Imagem com indicação das Áreas de Proteção do Ambiente Natural (APAN’s) em Porto Alegre.

Fonte:  Sérgio A. M. Moura, adaptado do Google Earth, 2023.

A criação, efetivação e gestão adequada de unidades de conservação (UCs) de proteção integral e de uso sustentável é uma das melhores estratégias, internacionalmente reconhecidas, para a conservação da biodiversidade, neste sentido o 15º objetivo do desenvolvimento sustentável (vida terrestre) apontou como meta proteger-se pelo menos 17% dos biomas terrestres até 2020, sendo que apenas cerca 1,5% de nossos ecossistemas estão protegidos em Porto Alegre.

Além de implantar e efetivar UCs, é necessário manter, implantar e recuperar os corredores ecológicos, para que estes funcionem como canais de conectividade, agregando eficácia a este instrumento de planejamento urbano e conservação ambiental, em suporte às lacunas decorrentes dos limites do licenciamento urbanístico e ambiental pontual.

As áreas de preservação permanente de cursos d’água (APPs), suas nascentes e as faixas da orla do Lago Guaíba, são exemplos de corredores ecológicos naturais, distribuídos em todas as regiões e tipologias da cidade em diferentes espectros de conservação e alteração, e que guardam em suas funcionalidades e riscos, as possibilidades de intervenções e as necessidades de conservação, de manutenção e de recuperação apontadas acima.

Neste sentido os Morros de Porto Alegre, e em especial os topos de morro, destacados elementos da paisagem natural e cultural da capital gaúcha, constituem-se em alvos objetivos destas conexões integrando ainda o Plano de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica.

2 - Conceitos de corredores ecológicos e resoluções das conferências municipais relacionadas

O  Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) Lei Federal Nº 9.985, de 18 de julho de 2000, em seu artigo 2º, XIX,  conceitua corredores ecológicos como “porções de ecossistemas naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservação, que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a dispersão de espécies e a recolonização de áreas degradadas, bem como a manutenção de populações que demandam para sua sobrevivência áreas com extensão maior do que aquela das unidades individuais”.

O Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental (PDDUA), Lei Complementar (LC) Nº 434, de 1º de dezembro de 1999, alterado pela LC Nº 646, de 22 de julho de 2010, em seu artigo 88, III, §5º conceituou que: “Os Corredores Ecológicos como áreas remanescentes florestais, Unidades de Conservação, Reservas Particulares, Reservas Legais, Áreas de Preservação Permanente ou quaisquer outras áreas de florestas naturais que possibilitam o livre trânsito de animais e dispersão de sementes das espécies vegetais e o fluxo gênico entre as espécies da fauna e flora e a conservação da biodiversidade e garantia da conservação dos recursos hídricos do solo, do equilíbrio do clima e da paisagem, delimitados e instituídos por lei.” 

Já a Lei nº 679, de 26 de agosto de 2011, que instituiu o Sistema Municipal de Unidades de Conservação da Natureza (SMUC) de Porto Alegre, adotou o mesmo conceito da Lei Federal.

Em abril de 2012, a V Conferência Municipal de Meio Ambiente de Porto Alegre, a terceira resolução referente ao eixo temático: cinturão verde e paisagem urbana, indicou a necessidade de implementar mecanismos de proteção e de gestão dos Corredores Ecológicos entre áreas Naturais, incluindo os morros da capital, a vegetação ciliar, a orla, entre outros.

Em novembro de 2022 a 6ª Conferência Municipal do Meio Ambiente aprovou entre outros itens da Proposta 2, referente ao MODELO ESPACIAL:

“Avaliar, incluir e detalhar as categorias das áreas ambientais no Plano Diretor. Criar corredores ecológicos a fim de articular estratégias de desenvolvimento, tais como caminhos rurais, rotas das hortas, trilhas de longo curso, áreas de observação de fauna e conexões dos morros. Estudar a viabilidade da criação da Unidade de Conservação do Morro Santana em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)” ...

3 - A utilização dos corredores ecológicos no planejamento urbanístico e ambiental municipal

Para que o desenvolvimento urbano e ambiental promova efetivamente a qualidade de vida, a conservação da biodiversidade e a preservação das condições ambientais, é necessário incorporar as variáveis ambientais já na gênese dos projetos de desenvolvimento, e para tanto é necessário dar publicidade às informações de base que indicam as potencialidades e condicionantes aos diferentes bens ambientais.

A existência de faixas de APPs de curso d’água e de nascentes, ou a existência de APANs são informadas nas etapas iniciais dos projetos, contudo, a existência de corredores ecológicos derivados das UCs, ou de outros locais de interesse para a conservação da biodiversidade são muitas vezes, inclusive por soluções administrativas adotadas, desconsideradas nas análises pontuais, ou ainda avaliadas apenas em etapas adiantadas, o que não raro gera frustações de expectativas às partes, perda de oportunidades de qualificações ambientais ou mesmo a degradação ambiental.

Para se cotejar adequadamente os aspectos urbanísticos e ambientais, observando que os corredores ecológicos se estendem por um território diversificado em termos de uso do solo, incluindo áreas rarefeitas, rurais, naturais, intensivas, urbanas e industriais, é necessário recorrer com proporcionalidade às tipologias existentes e projetadas, em termos de taxas de ocupação, zoneamentos e outros gravames e indicadores constantes do plano.

As soluções para a garantia da funcionalidade de um corredor ecológico para determinados organismos podem variar de acordo com o propósito e com o uso do solo onde está projetado. A arborização urbana, a instalação de dispositivos de passagem aérea a exemplo das pontes de cordas para primatas e demais mamíferos arborícolas, tuneis de passagem subterrâneos, dutos em cursos d’água e a conservação faixas de florestas, campos, matas de restinga, cercas de contenção e direcionamentos entre outros são exemplos de soluções que se podem adotar.

Para atender às resoluções das conferências citadas, sugere-se a disponibilização dos gravames de corredores ecológicos naturais na etapa de Declaração Municipal (DM) e DMWEB, incluindo os alvos e as conexões que se pretendem reestabelecer no futuro, à semelhança do apresentado no Mapa 2 (Corredores Ecológicos e Conexões).

Mapa 2 – Imagem com indicação de corredores ecológicos e conexões de planejamento com áreas de interesse ambiental em Porto Alegre.

Fonte: Sérgio A. M. Moura, adaptado do Google Earth, 2023.

Sugere-se também que o conceito de corredor ecológico a ser adotado pelo PDDUA na ocasião de sua revisão seja o mesmo do SNUC e SMUC, uma vez que este é mais amplo e adequado à conservação dos ecossistemas municipais. 

E por fim, reforça-se a necessidade de compreender os Corredores Ecológicos como instrumentos de planejamento urbanístico e ambiental enfatizando sua dimensão de planejamento em razão de suas funcionalidades, buscando a promoção da qualidade de vida e do ambiente na perspectiva da qualificação ambiental do território municipal.

REFERÊNCIAS

 

CHAVES, Ó.M. et al. Wildlife is imperiled in peri-urban landscapes: threats to arboreal mammals. Science of The Total Environment, [s.l., v. 82,  May 2022.  Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969721079626?via%3Dihub . Acesso em 6 out. 2023.  

 

CONFERÊNCIA MUNICIPAL DO MEIO AMBIENTE, 6., 2022, PORTO ALEGRE. Ata da etapa de encerramento. Porto Alegre: SMAMUS, 2022. 68 p. Disponível em: https://prefeitura.poa.br/sites/default/files/usu_doc/sites/smamus/6a.%20Confer%C3%AAncia%20Municipal%20do%20Meio%20Ambiente%2019.11.2022.pdf . Acesso em 6 out. 2023.  

DANCIGER, Hannah Torres; GADELHA, Valmirio Alexandre. Análise   da   interface   entre   o   direito   urbanístico   e   o   meio ambiente para o desenvolvimento de corredores ecológicos urbanos no planejamento urbanístico. Revista de Direito Urbanístico, Cidade e Alteridade: [s.l.], v. 6, n. 2, p. 93-113, jul. /dez. 2020. Disponível em:  https://indexlaw.org/index.php/revistaDireitoUrbanistico/article/view/6945/pdf  Acesso em 6 out. 2023.

 

MP Ajuíza Ação Para implantação de corredores ecológicos em Porto Alegre. Porto Alegre:  Ministério Público do Rio Grande do Sul/ Promotoria de Justiça do Meio Ambiente de Porto Alegre. Porto Alegre: 2017.  Disponível em:  https://www.mprs.mp.br/noticias/45316/ Acesso em 6 out. 2023.  

 

ONU.   Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável no Brasil:  ODS 15 Vida terrestre: Instituto de pesquisa Econômica Aplicada, [s.l.], 2019. Disponível em:  https://www.ipea.gov.br/ods/ods15.html Acesso em 6 out. 2023.  

RODRÍGUEZ, K.; LARA, L.R.; SÁNCHEZ, A., RAMÍREZ, D.; RAMÍREZ, S.  Guía para la prevención y mitigación de la electrocución de la fauna silvestre por tendidos eléctricos en Costa Rica.  2. ed.   San José (Costa Rica): Ministerio de Ambiente y Energía, 2020. 98p. Disponível em: https://drive.google.com/file/d/1NGw4jvfDZXiHUOwaPtfH2OoSweUgJtrM/view. Acesso em 6 out. 2023.  

 

RESOLUÇÕES.  In:   CONFERÊNCIA MUNICIPAL DO MEIO AMBIENTE DE PORTO ALEGRE, 5., 2012.; PRÉ-CONFERÊNCIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE, SANEAMENTO BÁSICO E ENERGIAS RENOVÁVEIS, 3. Porto Alegre: Secretaria Municipal do Meio Ambiente, 2012.  55 p. Tema: Ética do cuidado ambiental em Porto alegre: O futuro da paisagem. Disponível em:  https://prefeitura.poa.br/sites/default/files/filefield_paths/cartilhavconferenciamunicipaldomeioambiente.pdf. Acesso em 6 out. 2023.  

REFERÊNCIAS LEGISLATIVAS

BRASIL. Lei  no 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. Planalto:[s.d]. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm#:~:text=LEI%20No%209.985%2C%20DE%2018%20DE%20JULHO%20DE%202000.&text=Regulamenta%20o%20art.,Natureza%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias. Acesso em: 3 out. 2023.

 

PORTO ALEGRE. Lei Complementar nº 679, de 26 de agosto de 2011. Institui o Sistema Municipal de Unidades de Conservação da Natureza de Porto Alegre (SMUC – POA) e dá outras providências. Leis Municipais, [2022]. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a1/rs/p/porto-alegre/lei-complementar/2011/68/679/lei-complementar-n-679-2011-institui-o-sistema-municipal-de-unidades-de-conservacao-da-natureza-de-porto-alegre-smuc-poa-e-da-outras-providencias?q=679. Acesso em: 3 out. 2023.

 

PORTO ALEGRE. Lei complementar nº 646, de 22 de julho de 2010. Altera e inclui dispositivos, figuras e anexos na Lei Complementar nº 434, de 1º de dezembro de 1999 – Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Porto Alegre (Pddua) –, e alterações posteriores, e dá outras providências. Porto Alegre: Leis Municipais, [2015]. Disponível em:

https://leismunicipais.com.br/a/rs/p/porto-alegre/lei-complementar/2010/64/646/lei-complementar-n-646-2010-altera-e-inclui-dispositivos-figuras-e-anexos-na-lei-complementar-n-434-de-1-de-dezembro-de-1999-plano-diretor-de-desenvolvimento-urbano-ambiental-de-porto-alegre-pddua-e-alteracoes-posteriores-e-da-outras-providencias. Acesso em: 3 out. 2023.

Visite nosso site, www.astecpmpa.com.br, curta e compartilhe nas redes sociais.

Artigos | Revista da Astec, v. 23, n. 51, janeiro 2024.

Convenio.png
bottom of page